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Má vontade política deixa Pantanal esperando dinheiro do BID há 22 anos

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Programa Pantanal foi assinado por FHC e o Governo Zeca do PT em 2001. Dois anos depois, em seu primeiro governo, Lula cortou 97% dos investimentos federais e agora tenta tirar o programa do papel com o “Bid Pantanal” para novos projetos a serem apresentados pelos governos de MS e MT

Comunidade Barra do São Lourenço recebe ações esporádicas. Dinheiro do BID deve bancar saneamento básico

Assinado em 2001, o Programa Pantanal, que previa investimentos de 400 milhões de dólares (quase R$ 2 bilhões) em obras e ações de proteção, preservação e desenvolvimento sustentável do bioma, nunca saiu do papel. Neste ano, o Governo Lula anunciou a retomada do programa, financiado pelo BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento.

Os Ministérios de Orçamento e Planejamento e de Agricultura e Pecuária (MAPA) foram escalados para refazer a proposta de financiamento do programa, rebatizado de BID Pantanal. O Ministério do Meio Ambiente, que no primeiro governo de Lula fez objeção a pontos do empréstimo, desta vez ficou de fora das negociações e formatação dos projetos.

  • As discussões sobre impactos ambientais, atividades sustentáveis e restrições voltam ao mesmo ponto de 22 anos atrás e as preocupações quando às pressões políticas e divergências regionais também se repetem.

Os governos de MS e MT têm até este mês de novembro para encaminhar os projetos ao Ministério do Planejamento. Em Mato Grosso do Sul o Governo do Estado elegeu a recuperação do Alto Taquari para aplicação do dinheiro que vier do BID. Para outras ações  no Baixo Pantanal a ideia é investir recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

O assoreamento do Rio Taquari é o passivo ambiental mais “escandaloso”, segundo ambientalistas, pelo longo tempo de espera por intervenções para sua recuperação. A degradação chegou a um ponto em que os investimentos necessários à recuperação chegariam perto de meio bilhão de reais.

O Programa Pantanal foi sepultado logo no primeiro governo do PT, em 2003, quando o presidente Lula cortou 97% dos recursos federais. Faltando um ano para encerrar a primeira gestão petista, a então ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, criticou o acordo com o BID assinado no governo de Fernando Henrique Cardoso.

Negando que o financiamento seria cancelado, Marina dizia à época que o dinheiro não viria de graça, porque o governo teria que bancar uma contrapartida equivalente ao montante a ser financiado, de US$ 400 milhões.

“Não era vantajoso do ponto de vista do interesse público, não estava atendendo às necessidades do País”, justificava Marina Silva. Ela culpava o governo do PSDB por cláusulas que dificultavam a licitação de obras. “Para internalizar os recursos, o governo federal pagava uma taxa muito maior do que o que estava sendo disponibilizada para os investimentos”, dizia.

CORTE DOS INVESTIMENTOS

Comunidades em áreas mais isoladas dependem mais de investimentos em atenção básica e infraestrutura

O projeto original previa sobre o aporte do BID uma contrapartida de 25% do Governo Federal e participações de 12% para cada governo de MS e MT. Ao longo de quatro anos deveriam ser gastos US$ 165 milhões para descontaminar os rios, diminuir o assoreamento, proteger a vegetação, construir estradas, alavancar o ecoturismo e incentivar a economia. Após esse período, o contrato poderia ser renovado por outros quatro anos, com previsão de serem injetados US$ 400 milhões até 2009.

A primeira fase do convênio terminou e dos US$ 165 milhões iniciais, foram gastos apenas US$ 4,6 milhões, basicamente em juros e taxas do empréstimo e em inúmeras consultorias. No ano de 2002 foi movimentada uma pequena quantia do total previsto no projeto. Com cada parte do acordo entrando com sua contribuição.

  • Segundo informações do governo à época, estavam previstos R$ 30 milhões para o ano de 2003. O governo Lula decretou contingenciamento e decidiu gastar apenas 3% do que deveria colocar como contrapartida.

O corte do Governo Federal levou os dois Estados também a não desembolsar suas partes, sepultando de vez o Programa Pantanal. O que chama a atenção é que nenhum dos dois governos estaduais exerceu qualquer pressão política para fazer Lula rever o corte dos investimentos federais e destravar a liberação do dinheiro do BID.

RETOMADA PODE LEVAR ANOS

Neste semestre, o ministro da Agricultura e Pecuária (MAPA), Carlos Fávaro, iniciou por Mato Grosso uma série de audiências públicas em municípios do Pantanal mato-grossense para debater as prioridades do Estado, anunciando que sugeriu e Lula concordou que os estados e os municípios contemplados não sejam os devedores do financiamento dos projetos. Que o devedor fique sendo a União, cabendo apenas ao Governo Federal o ônus da amortização do empréstimo.

Segundo o ministro, o programa desta vez deve sair do papel porque foi incluído entre os três grandes investimentos de desenvolvimento regional do País com dinheiro do BID, focados na sustentabilidade. Fávaro ainda propaga que os projetos não prejudicam as atividades produtivas locais.

“Nós temos que tirar definitivamente o preconceito de que produzir é contra o meio ambiente, que agricultores e pecuaristas são contra o meio ambiente. E o inverso também: que o meio ambiente é contra os produtores rurais. Não existe isso”, disse o ministro em audiência com autoridades do MT. Fávaro não sinalizou, no entanto, por quantos anos será necessário esperar pela aprovação do financiamento e nem o cronograma de consultorias técnicas, que em regra são demoradas e custam caro.

  • Os analistas mais céticos preveem que o governo Lula deve passar pelo menos dois anos propagando o convênio com o BID, além de ter que dissuadir o lobby de usineiros, sojicultores e mineradores que tentam expandir suas atividades no entorno do Pantanal e bacias hidrográficas do Paraguai e Paraná.

As propostas de MS e MT serão analisadas pelo Conselho de Financiamento do BID até dezembro. Para os governos dos dois estados pantaneiros o desafio é agasalhar os interesses e necessidades dos vários municípios sob influência do Pantanal, organizações civis e produtores rurais. Em Mato Grosso já há debates acalorados entre as prefeituras sobre quem deve receber mais dinheiro em função das demandas e vulnerabilidade ambiental.

LEI ESTADUAL

Da parte de Mato Grosso do Sul, enquanto o MAPA encaminha a reformulação do Programa BID Pantanal, o governador Eduardo Riedel iniciou discussões com produtores e o trade turístico para elaborar uma lei estadual específica sobre o desenvolvimento sustentável do Pantanal. Ele recebeu pecuaristas pantaneiros no início de outubro e considerou “importante discutir o desenvolvimento sustentável da região, levando em conta o alcance social, que impacta diretamente na vida do pantaneiro”.

O governador disse que há o desafio ambiental de preservar e ainda transformar as atividades no Pantanal em renda aos produtores locais. “Por isso estamos discutindo um fundo de investimento específico sobre o bioma com o BNDES. Nosso foco é na preservação e no campo social em todo Estado, sem deixar ninguém para trás”.

Quanto ao dinheiro do BID, Riedel projeta investir na recuperação do Taquari. De acordo com o Instituto de Meio Ambiente do Estado (Imasul), ações de conservação e preservação ambiental na bacia do Rio Taquari teriam impacto direto em toda planície pantaneira.

MAIOR DESASTRE AMBIENTAL DO PANTANAL

Bancos de areia no leito navegável do rio Taquari (Foto: Silvio Andrade-Lugares)
  • O projeto do Taquari é tão antigo quanto o programa de duas décadas atrás, agora adotado pelos Ministérios do Orçamento e Planejamento, e da Agricultura e Pecuária e incluído na nova versão do PAC.

Segundo o Imasul, o primeiro projeto, visando a recuperação, preservação, recomposição florestal, manejo e recomposição do solo da área do Alto Taquari, está orçado em US$ 100 milhões.  Seriam necessários outros US$ 100 milhões para ações diretas na preservação, conservação, políticas de saneamento e resíduos sólidos em outras áreas do Pantanal.

Enquanto o programa BID Pantanal não desenrola, o Governo de MS executa ações pontuais através de um Plano Estadual de Manejo e Conservação do Solo e Água (Prosolo) em parceria com o Instituto Taquari Vivo e o Consórcio Intermunicipal Cointa na microbacia do córrego Pontinha, em Coxim, no Norte do Estado. São intervenções visando a recuperação de área degradada, recomposição de reserva legal e adequação das estradas vicinais na tentativa de conter o processo de assoreamento do Taquari.

Os trabalhos começaram no final de 2021 com meta de recuperar 2,4 milhões de hectares de lavouras e pastagens e readequar 6,6 quilômetros de estradas vicinais. Ate julho deste ano haviam sido executados 330 quilômetros de terraços nas lavouras e pastagens para contenção de processos erosivos, abrangendo uma área de 1.600 hectares. Em outra frente, o Imasul iniciou o plantio de 2 milhões de mudas de árvores nativas do Cerrado para recompor a vegetação em uma área de 1.300 hectares ocupada por pastagem degradada na região do Parque Estadual das Nascentes do Rio Taquari.

  • O Pantanal sul-mato-grossense (dois terços de todo o bioma) mantém aproximadamente 85% de sua área preservada, mesmo após três séculos de ocupação humana. Ainda assim, o Governo do Estado assume o compromisso de garantir a continuidade da conservação e sustentabilidade do desenvolvimento para a região.

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