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Gasbol poderá ser “invertido” para importação de gás argentino   

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Produção decrescente na Bolívia preocupa governo brasileiro e acelera discussão sobre uso da parte ociosa do Gasoduto-Brasil Bolívia para importar gás de “Vaca Muerta”

Gás argentino pode entrar por Corumbá ou por outra ponta do Gasbol, no Rio Grande do Sul (Foto: Arquivo – Silvio de Andrade)
Por Agência 24h*

O governo brasileiro já admite acelerar a discussão sobre acordo com o governo argentino para a importação de gás natural. A ideia é aproveitar o Gasoduto Brasil-Bolívia (Gasbol) para trazer o gás argentino. Para isso, há duas hipóteses em estudo.

A primeira seria fazer a inversão do Gasoduto Norte na Argentina, permitindo o direcionamento do gás para a Bolívia, cuja molécula, então, poderia ser integrada ao Gasbol. Nesse caso o gás argentino entraria por Corumbá.

A segunda hipótese, que está sendo vista como a mais viável, é fazer a inversão do Gasbol. O gás entraria pelo Rio do Sul, mas para isso seria necessário construir um ramal de Uruguaiana até Porto Alegre para conexão ao Gasbol. A obra está listada como prioritária no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) pelo governador Eduardo Leite.

Se a ligação entre Uruguaiana e Porto Alegre sair do papel, outra questão importante é que será preciso ajustar o Gasbol no lado brasileiro e, no lado argentino, concluir a segunda fase das obras do Gasoduto Nestor Kirschner. Nas duas alternativas a Argentina precisa investir da ampliação dos gasodutos. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) já sinalizou linha de financiamento para o gasoduto argentino até Uruguaiana.

Ramificações do Gasbol entre MS e o Sul do Brasil (Foto: Reprodução)

Hoje, o gasoduto é uma “via de mão única”, seguindo de Mato Grosso do Sul em direção ao Rio Grande do Sul. Esse fluxo também teria que subir, passando a levar o gás da Região Sul para cima, para atender Minas Gerais, por exemplo, tornando-se uma espécie de pista dupla.

Existe uma forte preocupação em termos de oferta, porque a Bolívia, principal fornecedor, está com uma produção decrescente. Hoje, os bolivianos só enviam ao Brasil 15 milhões de metros cúbicos (m³) por dia, quando deveriam entregar 30 milhões m³/dia. E o Brasil tem uma carência no fornecimento. O gás doméstico (distribuído pela Petrobrás) é caro e insuficiente, na avaliação do governo.

Porém, as duas possibilidades em estudo para trazer ao Brasil o gás argentino dependem da conclusão da segunda parte do Gasoduto Néstor Kirchner, que liga a região de Vaca Muerta, a partir da província de Buenos Aires, até Uruguaiana (RS).

Se a alternativa for trazer o gás argentino através de uma conexão com o Gasbol pelo território boliviano, seria pago um pedágio à Bolívia pela passagem. Nesse caso não haveria a inversão do Gasbol, mas o Gasoduto Norte na argentiva teria que passar por esse processo para conexão com o gasoduto Brasil-Bolívia.

Se a opção for pela ligação direta do Gasoduto Norte argentino até Uruguaiana, seriam duas obras – ramal de Uruguaiana até Porto Alegre e da capital gaúcha a inversão para subir o gás argentino pelo Gasbol. Antes de entrar no Brasil, porém, é preciso concluir o gasoduto Néstor Kirchner e fazer a conexão ao Gasoduto Norte.

No ano passado, quando o país era presidido por Alberto Fernández, a previsão era que as obras do Gasoduto Norte fossem concluídas até o fim de 2024 ou início de 2025. Mas o novo presidente argentino, Javier Milei, ainda não sinalizou se há interesse na obra ou em manter o prazo estimado.

Salto na produção

Maior empresa privada de energia da Argentina e maior produtora privada do gás de Vaca Muerta, a Pan American Energy (PAE) vê como importante os investimentos na ampliação da malha de gasodutos do país vizinho.

Segundo Alejandro Catalano, diretor-geral da PAE no Brasil, o gás de Vaca Muerta, segunda maior reserva de gás não convencional do mundo, tem ainda um grande potencial de crescimento.

Obras do Gasoduto Nestor Kirchner, no Norte da Patagônia (Foto: Reprodução)

Ele lembra que a produção da companhia aumentou de 2,5 milhões m³ por dia em 2015 para 13 milhões metros cúbicos por dia em 2023. Ao citar a importância da infraestrutura, lembrou que parte da produção já é exportada para o Chile, por meio de quatro diferentes redes de gasodutos.

Gás competitivo – As reservas de gás na Argentina são imensas. É um gás diferente do boliviano, por trazer xisto em sua composição. Mas é uma molécula muito competitiva. “A Argentina tem gás competitivo. Tem que ser feita infraestrutura para compartilhar esse gás com a região. Acreditamos que isso vai acontecer. É uma fonte competitiva para a região e a integração dos países. O gás é a ponte para o futuro”, afirma Catalano.

Segundo ele, a Argentina tem investido na ampliação da infraestrutura. Ele cita a inauguração da Etapa I do Gasoduto Néstor Kirchner, conectando a região de Vaca Muerta a Saliqueló, na província de Buenos Aires.

Cita ainda a perspectiva de início das obras da Etapa II do gasoduto, de Saliqueló até San Jerónimo, de onde teria de ser feita uma ampliação para levar o traçado até o gasoduto que faz a conexão com a cidade gaúcha de Uruguaiana.

Catalano lembra ainda outro investimento importante que será feito este ano: a inversão do Gasoduto Norte na Argentina. Isso permitirá direcionar o gás para a Bolívia, cuja molécula, então, poderá ser integrada ao Gasbol:

“Potencialmente esse gás poderia chegar ao Brasil em 2025. Apesar da complexidade de ter mais países envolvidos, há necessidade de um gás competitivo. Por isso, acreditamos que é possível uma negociação.”

Inversão do fluxo do Gasbol

A inversão do Gasbol, no entanto, não é uma solução tão simples. Segundo empresas, o desafio é o investimento necessário para isso. A obra, orçada entre US$ 1 bilhão e US$ 1,2 bilhão, nunca saiu do papel.

A TSB, que opera o trecho de 25 quilômetros que liga a malha argentina até Uruguaiana e o trecho em Porto Alegre, tem como acionistas Petrobras, Ipiranga, Repsol e Total. Cada uma tem 25% da empresa. Procurada, a Petrobras disse apenas que não é a controladora.

Mensagem argentina – A Argentina tem gás de sobra para exportar ao Brasil e vê condições favoráveis para negociar contratos de longo prazo com a indústria brasileira.

Essa foi a mensagem dada pelos argentinos (autoridades do governo e agentes do mercado) a um grupo de empresários brasileiros que viajou a Buenos Aires no início do mês, ao lado de membros do governo, para prospectar oportunidades de importação de gás.

No encontro, a estatal argentina Enarsa sinalizou que, garantida a expansão da infraestrutura necessária, estão criadas as bases para o envio do gás ao Brasil a partir de 2027. A empresa estima que o envio de gás ao mercado brasileiro pode começar com uma capacidade mínima de 11,5 milhões de m3/dia.

A missão brasileira a Buenos Aires foi organizada com o objetivo de abrir as conversas e entender melhor as perspectivas do país vizinho, após a mudança do governo local. Ainda não foi o momento de se colocar propostas na mesa, mas os argentinos prometeram um gás competitivo.

Os preços do gás em Vaca Muerta, de US$ 3,5 o milhão de BTU na média, são extremamente competitivos. Masnão quer dizer que a indústria brasileira conseguirá pagar algo parecido. As exportações na Argentina são regidas por preços mínimos – o Chile, por exemplo, paga cerca de US$ 6,3 o milhão de BTU pela molécula este ano.

A Enarsa estima que seja possível vender gás em São Paulo entre US$ 9 e US$ 10 o milhão de BTU (molécula + transporte). Para efeitos de comparação, o preço da Petrobras, com transporte, é superior a US$ 12 o milhão de BTU atualmente.

Mas tudo ainda está no campo das estimativas. Não houve uma negociação formal de preços nesse primeiro encontro. Preços, prazos, volumes… todos esses números ainda são estimativas que, para se concretizarem, dependem de um longo caminho a ser percorrido.

Falta, por exemplo, clareza sobre as tarifas de conexão do gás argentino para o Brasil – sobretudo na hipótese de o gás vir a passar pela infraestrutura da Bolívia.

Falta transparência sobre as tarifas de transporte na própria Argentina – cujo governo atual, de Javier Milei, promete uma revisão geral dos subsídios contidos na tarifa do gás.

Esse cenário pode levar a um reajuste dos valores atualmente praticados (as tarifas das transportadoras devem começar a subir a partir deste mês de abril).

Quanto aos prazos, tudo vai depender, claro, do ritmo das negociações, ajustes regulatórios e dos investimentos em infraestrutura.

Operários em obra de expansão do Gasoduto Norte na região de Vaca Muerta (Foto: Reprodução)

Do lado argentino, os agentes bateram na tecla de que as condições para viabilizar as exportações são favoráveis, mas que será necessário: fortalecer o regime regulatório local para exportações (eliminando restrições), além de muita coordenação entre os dois países (ou três, se a rota de exportação for via Bolívia); e investimentos na rede de gasodutos da Argentina (e do Brasil, se a opção foi importar via Uruguaiana/RS).

Custo climático do Gás Natural Liquefeito

Há uma aposta do setor de gás e energia na distribuição do GNL (Gás Natural Liquefeito). A vantagem é que a liquefação reduz o volume em até 600 vezes e pode ser transportado sem a necessidade de gasoduto.

Defensores do gás natural argumentam que ele é um “combustível de transição” — definição mencionada inclusive no texto final da última conferência climática da ONU, a COP28. Esse enquadramento entende o gás como um possível substituto ao carvão (muito mais poluente) na geração de energia. Porém, as emissões de gases de efeito estufa associadas ao GNL são expressivas.

Para os especialistas, chamar o gás de combustível de transição é enganoso. É um combustível fóssil que terá de ser abandonado e sua incorporação como combustível só é benéfica enquanto serve para acelerar o fechamento das fontes de combustíveis fósseis. Isso significa que a longo prazo as novas estruturas de gás deverão ser fechadas para dar lugar às fontes renováveis ou com zero emissões.

(Com informações das agências internacionais, empresas de gás, sites especializados e estatais do setor de gás e energia)

 

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