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População indígena cresce – mais urbanizada e criativa

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Etnoturismo surge como estratégia de sobrevivência nas cidades e deve se tornar mais competitivo graças ao artesanato, grafismo e pinturas corporais

Busca de oportunidades e conflitos por terra provocam êxodo e fazem aumentar aldeias nas cidades. Campo Grande já tem 13 comunidades indígenas, desde a criação da primeira aldeia urbana em 1998. E a população indígena segue crescendo e se adaptando à vida urbana.

Potes de cerâmica Kadwéu (Foto: Chico Ribeiro)

De acordo com o Censo do IBGE realizado no ano passado, a parcela da população do Estado que se autodeclara indígena passou de 73.295 em 2010 para 96.029 em 2022, um crescimento de 31,02%. A maioria vivendo em suas aldeias, distribuídas por 28 municípios, segundo o Distrito Sanitário de Saúde Indígena (DSEI-MS). São oito etnias, Guarani, Kaiowá, Terena, Kadwéu, Kinikinaw, Atikun, Ofaié e Guató.

Entre aglomerados urbanos e rurais, o conflito fundiário é a principal inquietação. No aspecto da sobrevivência, a produção artesanal tem sido uma atividade tradicional que agrega dois valores – cultural e econômico. No mercado o artesanato é um produto cada vez mais valorizado. O que para os indígenas é uma forma de expressar a identidade cultural, para o etnoturismo trata-se de um promissor ativo econômico.

Artesanato Kadwéu (Foto: Reprodução Internet)

Segundo o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), há 25 áreas à espera de demarcação, mas em situação de conflito e agora sob o impasse do marco temporal. Dez áreas possuem estudo de identificação e delimitação e outras dez já foram declaradas pelo Ministério da Justiça como território indígena, mas isso não significa que a terra seja ocupada pelos indígenas.

A falta de uma definição tem provocado “invasões” de fazendas tituladas no período de colonização do governo Vargas. A alternativa que vem sendo defendida há décadas é a indenização de produtores que estariam em áreas indígenas, com pagamento pela terra nua e todas as benfeitorias.

Transformações sociais não mudam ponto central

Sabe-se que a preservação da cultura se dá pelo valor que os povos originários dão aos ensinamentos dos antepassados e as tradições transpõem as gerações. E uma das sabedorias é a coexistência pacifica com o meio ambiente. Logo, a ocupação e degradação do ambiente natural impacta o que há de mais sagrado para os indígenas, a terra, que diminuiu e fez desencadear o êxodo.

Quebra de protocolo – Primeira aldeia urbana elegeu também a primeira cacique. Enir Teixeira tomou posse em 2008 (Foto: Edmir Conceição)

A fixação de indígenas nas cidades é justificada pelas políticas públicas de inclusão dos povos originários. Políticas afirmativas, inclusive, erradicando estereótipos sobre a condição social e capacidade produtiva. Em que pesem as transformações, como a tecnologia, celular e Inteligência Artificial, muito dificilmente a população indígena abandonará sua cultura e a luta por terra.

Tecnologia foi uma mudança positiva, abrindo canal para que o indígena dissemine a sua cultura (que inclui muitos hábitos que as populações brancas e negras praticam nos dias atuais) e, também, amplifique suas inquietações. Hoje os índios de Mato Grosso do Sul vivem da agricultura e da pecuária, integrados ao processo de desenvolvimento, como parte da chamada “sociedade branca”, o que demanda arbítrio na solução de conflitos e políticas públicas inclusivas.

Artesanato Terena (Foto: Edmir Conceição)

A força dos trabalhos manuais

O que se sobressai, porém, é a cultura indígena, manifestada por meio do artesanato, um produto cada vez mais presente no mercado turístico, no recém descoberto segmento do etnoturismo. Mato Grosso do Sul tem muitas produções de artesanato, algumas delas tombadas como patrimônios imateriais, como a Viola do Cocho em Corumbá, a cerâmica terena, o artesanato Kadiwéu e as bugras de Conceição.

Terena e Kadwéu são as etnias que desenvolvem mais a produção artesanal, tanto como forma de expressar a cultura, como também para agregar valor econômico aos seus trabalhos, explorados pela plástica e pelo grafismo.

Museu das Culturas Dom Bosco, no Parque das Nações Indígenas (Foto: Edmir Conceição)

Além de habilidade na agricultura, os terenas são bons artesãos. As aldeias mais próximas dos centros urbanos abastecem as feiras com arroz, feijão, feijão de corda, maxixe, mandioca e milho, alimentos que formam a base de sua própria alimentação.

A alternativa atual do artesanato Terena, como meio de subsistência, se dá, principalmente, através do barro, da palha, da tecelagem – atividades que representam um nítido resgate de sua arte ancestral indígena.

Pesquisa – O “etnoturismo involuntário” é um nicho já abordado em projeto de pesquisa sobre a cerâmica Kadwéu realizado pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), em parceria com a University of Manitoba, no Canadá, coordenado pelo professor Antônio Hilário, pela UFMS, e antropóloga Viviane Luiza de Souza, pela Manitoba.

Pesquisadora Viviane Luiza comemora crescimento da produção artesanal em aldeia Kadwéu (Foto: Divulgação)

Ideia era investigar como se dá a conexão dos povos indígenas de várias etnias com o passado, sua influência nos dias de hoje, como se expressam através dos trabalhos manuais e de que modo a arte se constituiu em pilar de subsistência e sobrevivência.

No processo de investigação antropológica, a equipe de pesquisadores viu que o artesanato, além do seu simbolismo e valor artístico, é uma atividade rentável e capaz de promover o empoderamento das mulheres indígenas. Para entender tudo isso os trabalhos de investigação começaram pela comunidade Kadiwéu, em Porto Murtinho, na fronteira com o Paraguai.

Coexistência pacífica e inclusão produtiva – O pesquisador Antônio Hilário Urquiza vê com satisfação o processo de empoderamento das mulheres indígenas, situação que vai deixando para trás o estigma de pobreza e isolamento das comunidades indígenas. O artesanato é um trabalho predominantemente feminino.

Segundo ele a produção de cerâmica e de outros tipos de artesanato não contribui apenas com o sustento – ela desempenha um papel importante na vida familiar, na transmissão da cultura e também conecta as artesãs indígenas com a natureza.

Riqueza dos grafismos Kadiwéu e Terena – O grafismo Kadwéu é marcado pela disposição de elementos geométricos, considerado como características das sociedades hierárquicas e impressionam pela riqueza de suas formas e detalhes. Os finos desenhos constituem-se em uma forma notável da expressão de sua arte. Hábeis desenhistas estampam rostos com desenhos minuciosos e simétricos, traçados com a tinta obtida da mistura de suco de jenipapo com pó de carvão, aplicada com uma fina lasca de madeira ou taquara.

Caio, 12 anos, aluno da Escola Sulivan Silvestre, gosta de observar objetos no Memorial da Cultura Indígena instalado na Aldeia Urbana Marçal de Souza (Foto: Edmir Conceição)

As mulheres Kadiwéu produzem, igualmente, belas peças de cerâmica: vasos de diversos tamanho e formato, pratos também de diversos tamanhos e profundidade, animais, enfeites de parede, entre outras peças criativas. Decoram-nas com padrões que lhes são distintos, que segue a um repertório rico, mas fixo, de formas preenchidas com variadas cores. Os pigmentos são envernizados com a resina do pau-santo.

Já os padrões do grafismo usados pelos Terena são basicamente o estilo floral, pontilhados, tracejados, espiralados e ondulados. Assim como os Kadiwéu, os Terena produzem peças utilitárias e decorativas: vasos, bilhas, potes, jarros, animais da região pantaneira (cobras, sapos, jacarés que são chamados de bichinhos do Pantanal), além de cachimbos, instrumentos musicais e adornos. Os Guarani-Kaiowá produzem, além dos utensílios, instrumentos musicais, como o afoxé (chocoalho), armas (arco e flecha) e variados adornos, cocares, pulseiras e colares.

Expansão da produção artesanal – O objetivo da historiadora Viviane Luiza de Souza é promover o empoderamento de mulheres também de outras etnias, como a Terena e isso se dará também com a revitalização dos centros culturais rurais e urbanos, onde a produção artesanal é exposta e comercializada.

Junto com os antropólogos Hilário Urquiza e Andrea Caravaro, ela diz agora se dedicará a promover a produção das etnias oleiras Terena e Kinikinau, com extensão à aldeia São João, que tem uma configuração especial, pois lá residem os três povos oleiros: Terena, Kinikinau e Kadiwéu. “Pretendemos agregar os Kinikinau e os Terena no projeto, que tem seu foco na geração de renda, e iniciar um trabalho de etnoturismo em outras aldeias.

Pintura corporal Kadwéu (Imagem: https://www.culturagenial.com/pintura-corporal/

Pintura corporal – A pintura corporal recebe destaque entre as expressões artísticas dos Kadwéu, que no passado marcavam a hierarquia dos indivíduos. Os finos desenhos mostram que eles são hábeis desenhistas, estampam rostos com desenhos minuciosos e simétricos, traçados com a tinta obtida da mistura de suco de jenipapo com pó de carvão, aplicada com uma fina lasca de madeira ou taquara. O padrão gráfico Kadiwéu consiste no pontilhismo e em elementos alinhados e curvos, que formam desenhos com muitas variações geométricas e muito primor em seus detalhes. Neste grafismo se encontra um equilíbrio em todo o desenho, e as figuras são feitas para ornamentar a pele no dia-a-dia da sociedade e para os dias de festas

O que se sabe sobre as nações Kadwéu e Terena

Kadwéu – Durante centenas de anos eles dominaram uma extensão do trecho do Rio Paraguai e São Lourenço, enfrentando os portugueses e espanhóis que se aventuravam pelo Pantanal, tendo como base os aterros próximos às baías Uberaba, Gaiva e Mandioré.

Terena – Por serem agricultores e de índole pacífica, os índios Terena, quase sempre foram submetidos por outras nações mais guerreiras em uma tática de sobrevivência. Eles foram dominados pelos Guaicuru, em troca de produção de alimento, recebendo proteção contra outras tribos. Tinham uma submissão amistosa. Atualmente as comunidades estão concentradas na região noroeste de Mato Grosso do Sul. Pertencem ao tronco linguístico Aruak.

(Foto do destaque: Edmir Conceição)

 

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