quinta-feira, novembro 21, 2024
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“Por que não vão atrás do informal, do devedor contumaz, do sonegador?”, diz Rubens Ometto

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Pelo senso comum, Rubens Ometto Silveira Mello deveria ser a última pessoa a criticar qualquer um dos Poderes do Brasil.

Por Geraldo Samor e Pedro Arbex – Brazil Journal

Como controlador da Cosan – um conglomerado com empresas de gás, ferrovias e distribuição de combustíveis – Ometto talvez seja o empresário mais regulado do Brasil. Mas nem quem tem muito a perder está conseguindo ficar calado. Nas últimas semanas, a fragilidade do quadro fiscal, o sentimento de que todo o ajuste está sendo feito em cima da arrecadação, e as inúmeras mudanças de regras que alimentam a insegurança jurídica aumentaram a preocupação dos empresários com o ambiente de negócios no Brasil.

Ecoando esse sentimento crescente, Ometto conversou com o Brazil Journal
sobre os problemas nacionais e disse que, “do jeito que as coisas estão, eu vou ter que colocar o pé no freio.” “As empresas sérias não aguentam mais pagar essa taxa de juros e pagar impostos do jeito que esse País está fazendo,” disse Ometto.

A seguir, a íntegra da entrevista:

Qual a sua visão sobre a situação do Brasil?

Sempre acreditei no potencial deste País, tanto é que tenho 95% do meu patrimônio aqui. Sou engenheiro de formação e adoro tirar projetos do papel. Você sabe que o nosso grupo investe bilhões de reais todo ano em coisas que ampliam a infraestrutura, geram empregos e retorno para os nossos acionistas. Mas eu estou desanimado. Esse País está cansando até mesmo os mais otimistas. O Brasil fez muito nas últimas décadas: conseguimos controlar a hiperinflação, temos grandes reservas internacionais e uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo. Mas não está na hora de falar desse “copo meio cheio.” Está na hora de sermos honestos: o Brasil tem que se olhar no espelho e ver que está tudo errado, e precisamos nos unir para corrigir a rota.

A sua maior preocupação é o quadro fiscal?

Desde o começo, quando este arcabouço fiscal foi lançado, eu não acreditei nele. Por quê? Porque ele é baseado na ideia de permitir aumentar as despesas na medida em que a receita aumentasse – e não reduzir as despesas nem o estoque da nossa dívida. É uma questão de lógica: se a equação está montada assim, é claro que o Governo vai trabalhar furiosamente para aumentar a receita e poder gastar mais. Esta é uma visão oposta à de incentivar a iniciativa privada, que seria um caminho muito mais barato e muito mais eficiente para o País. Aí, o que aconteceu? Para se aprovar a Reforma Tributária, fizeram uma série de concessões. E depois, a Receita Federal, a Procuradoria Geral da União e a da Fazenda ficam mordendo todo mundo pelas bordas.

Como isso acontece?

Eles vão mudando as normas, vão mudando as regulamentações para arrecadar mais.
A lei sai de um jeito, e depois eles soltam normas para arrecadar mais. Isso aconteceu com a mudança da regra do CARF, com a regra do aproveitamento do ágio nas aquisições, com a mudança do crédito presumido do IPI, com a mudança do uso dos créditos do PIS/Cofins que saiu essa semana… os exemplos são muitos. Eles não estão preocupados em interpretar a ideia do legislador, estão preocupados em arrecadar.

O problema está no Executivo, no Legislativo ou no Judiciário?

O problema está na dinâmica entre eles, nessa disputa por espaço entre os Três Poderes, e às vezes nos acordos entre eles. O Executivo vai lá e faz embargos auriculares no Judiciário falando, ‘Olha, se não decidir desta forma, o País quebra’. E o Judiciário se deixa influenciar por isso e começa a ‘autuar’ em cima das empresas. O Judiciário invade a área do Legislativo, que reage contra os dois. E fica um se metendo na área do outro. Ninguém aguenta mais.

A insegurança jurídica passou dos limites?

É lógico! Quando falam do problema dos juros altos, todo mundo fala das questões
internacionais, dos juros nos Estados Unidos, que realmente atrapalham. Mas tem uma outra questão importante que pouca gente fala que é a nossa insegurança jurídica, que também encarece o dinheiro no Brasil. O custo de todas essas incertezas está ali na taxa de juro! Se o Governo organizasse tudo isso e controlasse a questão fiscal, os juros cairiam pelos motivos certos – e aí esse País voltaria a crescer, voltaria a se desenvolver – como nós vimos, aliás, no Governo Lula 1. O Presidente poderia repetir o que fez em seu primeiro mandato, com muito sucesso para todo o País. Ele sabe fazer. Mas do jeito que está, tentando fazer o ajuste só pela receita, e com os juros onde estão, fica muito difícil para quem investe – e a Cosan investe R$ 15 bilhões por ano no Brasil. Aliás, essa Reforma Tributária, que foi tão comemorada, do jeito que ela está, eu acho que talvez a gente devesse desistir dela. O Congresso deveria olhar isso com cuidado, porque durante a transição para o novo regime a complexidade vai aumentar ainda mais, e, depois da transição, o fato é que a carga tributária aumenta.

Como esse clima está afetando o investimento?

Você sabe que pelo volume dos nossos investimentos em infraestrutura, logística e no agro, eu devo estar entre os três maiores empreendedores privados deste País. Mas do jeito que as coisas estão, eu vou ter que colocar o pé no freio. As empresas sérias não aguentam mais pagar essa taxa de juros e pagar impostos do jeito que esse País está fazendo. O meu natural é continuar investindo, investindo, investindo. Mas numa situação dessas, a vontade que dá é parar de investir e distribuir dividendos. Nós temos projetos maravilhosos para fazer em todos os nossos negócios: em logística na Rumo, no gás, com a Compass, e no etanol de segunda geração, com a Raízen. Eu tenho mais de 95% do meu patrimônio no nosso País, e as pessoas até me criticam por isso. Mas como eu vou fazer para investir com as coisas desse jeito? Não dá. Não dá mais, gente.

Como o Brasil poderia resolver a questão fiscal?

Antes de mais nada, temos que fazer o óbvio: precisamos de uma reforma do Estado. Isso significa mais eficiência, o que levaria a uma menor necessidade de arrecadar. Mas se for para resolver pela via da arrecadação, por que não vão atrás do empresário informal, do ilegal, do devedor contumaz, do sonegador? O crime organizado já está assumindo a liderança neste setor. Eles já tem mais de mil postos de combustível, e já compraram mais de 4 usinas. Obviamente, eles não pagam impostos, e ninguém faz nada a respeito. Não dá para entender o Governo e o Congresso… Só a adulteração de combustíveis e a sonegação de impostos nesse setor gira em torno de R$ 18 bilhões. É perto do que eles querem arrecadar com essa mudança do PIS/Cofins. Existe uma lei para combater o devedor contumaz que está há três anos no Senado, e não sai da Comissão de Constituição e Justiça. É um negócio que é do interesse de todo mundo.

Essas críticas não podem causar desgaste com o Governo?

Mas eu falo é pra ajudar! Eu falo como brasileiro e como alguém que não só acredita como aposta tudo nesse País. O Governo não precisa de tapinha nas costas, e sim de pessoas que falem a verdade para ver se mudamos as coisas. Até porque, o que eu estou falando é o que todo mundo está pensando mesmo. Precisamos explicar à classe política o impacto das decisões deles na economia real. O Executivo, o Congresso e o Judiciário precisam entender que estamos caminhando para perder mais uma década – e se isso acontecer, o Brasil só vai gerar mais pobreza e desigualdade. Alguém quer isso? Você acha que o Lula quer isso? Ele quer o oposto disso! Eu conheço ele. Tenho certeza de que ele quer que o Governo acerte.

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