O turismo contemplativo em Mato Groso do Sul oferece roteiro de rica biodiversidade nos pantanais de Leste a Oeste
É comum aos turistas das partes mais distantes do país e estrangeiros desembarcarem em Cuiabá e, de lá, a 145 km, desembarcarem no Porto Cercado, em Poconé, às margens do rio Cuiabá, contemplar a rica biodiversidade do Pantanal. Os especialistas sabem que é difícil estabelecer um cálculo exato das dimensões desse bioma que é patrimônio da Humanidade e ocupa grande parte do centro oeste brasileiro e se estende pela Argentina, Bolívia e Paraguai, onde leva o nome de Chaco.
A grosso modo, no entanto, pode-se dizer que o miolo do Pantanal não está no Norte, mas sim ao Sul, abaixo do São Lourenço, onde se dividem os estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
Dois terços do “núcleo” da maior planície de sedimentação do mundo estão, de fato, situados no território de Mato Grosso do Sul, mas a localização imaginária leva os turistas a desembarcarem em Cuiabá e na saída do aeroporto buscarem o caminho para Corumbá. Descobrem, então, que deveriam ter desembarcado em Campo Grande e o destino está a 410 quilômetros da capital sul-mato-grossense. De qualquer modo, há pantanais para todos os gostos, com a mesma biodiversidade.
É preciso ter fôlego para conhecer o Pantanal. São muitos os lugares. É evidente, no entanto, que a exuberância da fauna e da flora se mostra mais intensa em algumas áreas e estas acabam sendo o principal destino do turismo contemplativo.
Rota Bonito-Pantanal – A vantagem de optar pelo Pantanal Sul é a possibilidade de incluir no roteiro a emblemática Bonito, na Serra da Bodoquena, que fia a 70 quilômetros de Miranda, o portal do Pantanal. Saindo de Campo Grande pela BR 060, passando por Sidrolândia, seguindo até Nioaque, chega-se a Guia Lopes da Laguna e logo em Bonito. A distância é de aproximadamente 280 km. De Bonito até Bodoquena e Miranda, são pouco mais de 70km. Dalí até Corumbá o percurso é de 200km.
Muitos preferem esse roteiro, pois integra o passeio pela paisagem da Mata Atlântica característica na Serra da Bodoquena e permite desfrutar das águas calcárias, podendo se estender até Jardim ondes estão as maiores dolinas do mundo, como a Loca das Araras, e dali seguir para o Pantanal, tanto em direção Norte (Corumbá), quando em direção ao Sul (Porto Murtinho). Nos dois caminhos o destino é o rio Paraguai.
No caso de Porto Murtinho, o turista vai conhecer o Pantanal do Nabileque em passeio inesquecível pela Serra da Bocaína. Na direção de Corumbá, são inúmeros os destinos a partir de Miranda, pois ali começa de fato o núcleo do grande Pantanal, pela BR-262, no extremo Oeste de Mato Grosso do Sul.
A melhor forma de conhecer o Pantanal é se hospedar em hotéis fazendas ou pousadas. Da Nhecolância, acima do rio Negro, até São Lourenço, ao norte do rio Paraguai, contempla-se a parte mais alagada do Pantanal. A melhor visão por terra se obtém através da Estrada Parque.
Para o visitante, o importante é a biodiversidade, verificar que na planície pantaneira há tuiuiús, onças, jacarés, uma infinidade de espécies de mamíferos, peixes, etc. O Pantanal é imenso, pontilhado por raros morros isolados e rico em depressões rasas, variados sistemas de elevações, como chapadas, serras e maciços e grande quantidade de rios, todos pertencentes à Bacia do Rio Paraguai.
Na paisagem pantaneira, a fisionomia altera-se profundamente nas duas estações bem definidas do ano: a seca e a chuvosa. Durante a seca, nos campos extensos cobertos predominantemente por gramíneas e vegetação de cerrado, a água de superfície chega a escassear, restringindo-se aos rios perenes, com leito definido, às grandes lagoas próximas a esses rios e a algumas lagoas menores e banhados em áreas mais baixas da planície. Em muitos locais torna-se necessário recorrer aos estoques subterrâneos, utilizando-se bombas manuais e moinhos de vento para garantir o fornecimento às casas e bebedouros de animais domésticos.
Os tons pardo-acinzentados da vegetação ressequida não só são substituídos pelo verde nos terrenos próximos à água superficial ou abastecidos pelo lençol freático.
As primeiras chuvas da estação caem sobre um solo seco e poroso e são facilmente absorvidas. Com o constante umedecimento da terra a planície rapidamente se torna verde no rebrotar de inúmeras espécies resistentes à falta d’água dos meses precedentes.
Em poucos dias o solo se encharca e não consegue mais absorver a água da chuva que passa a encher os banhados, as lagoas e transbordar dos leitos mais rasos, formando cursos de localização e volume variáveis.
Esse grande aumento periódico da rede hídrica no Pantanal, a baixa declividade da planície e a dificuldade de escoamento das águas pelo encharcamento do solo, são responsáveis por inundações nas áreas mais baixas, o que confere à região um aspecto de imenso mar interior.
Somente os terrenos mais elevados e os morros isolados sobressaem como verdadeiras ilhas cobertas de vegetação, onde muitos animais se refugiam à procura de abrigo contra a subida das águas.
OS DEZ PANTANAIS DO OESTE
Para turista se situar na grande planície alagada entre Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, é importante anotar os 10 mandamentos do bioma, ou seja, os 10 principais pontos de localização hoje chamados de pantanais. São eles, no Mato Grosso, Cáceres, Poconé e Barão de Melgaço.
Em Mato Grosso do Sul, são sete pantanais: Paiaguás, Corumbá, Nhecolândia, Abobral, Rio Negro, Miranda e Nabileque. Em relação á biodiversidade, os números são aproximados – 280 espécies de peixes, 90 de mamíferos, 600 de aves e 50 de répteis. A Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) estima 1.500 espécies de plantas.
Ecoturismo ajuda a conservar biodiversidade – Onça-pintada, tamanduá, sucuri, cervo, jacaré e anta. Os cinco animais mais buscados no Brasil, quando o assunto é turismo e natureza, se concentram no Pantanal. De acordo com o engenheiro agrônomo diretor do Instituto SOS Pantanal, Felipe Augusto Dias, por ser um ambiente moldado pelas cheias e secas, é possível avistar diferentes animais em diferentes épocas e conviver com surpresas constantes. “Acredito que a diversidade de espécies avistadas seja maior que em outras regiões”, comenta. Dessa forma, apesar da maior variedade de espécies se concentrar na Amazônia, a floresta dificulta o encontro com os animais. Já no Pantanal, o avistamento é facilitado por possuir ambientes mais abertos. Para a conservação da biodiversidade do bioma, no entanto, é fundamental incentivar o ecoturismo, o turismo contemplativo. Em Mato Grosso do Sul há o Pantanal da bacia do rio Paraguai, região Oeste, e também da bacia do rio Paraná, na região Leste.
O PANTANAL DO LESTE
O que o turista ainda não conhece e provavelmente nem tenha ouvido falar é do Pantanal da região Leste de Mato Grosso do Sul, formado pelos rios da Bacia do Rio Paraná, e ocupa uma porção dos territórios das cidades de Brasilândia (MS), São João do Pau D´Álho, Castilho e Paulicéia (SP). O Pantanal do Leste é constituído por unidades de conservação criadas pela Companhia Energética de São Paulo (CESP) em razão do represamento do rio Paraná e afluentes para construção de usinas hidrelétricas. Nos reservatórios criaram-se os parques aquícolas e às margens, nas áreas alagadas, as unidades de conservação, algumas delas ainda fechadas à visitação pública, como a reserva Cisalpina, em Brasilândia. Mas a vegetação, savanas e cerrados, se assemelha à flora pantaneira.
Criada em 1993, como parte das compensações ambientais que a Companhia Energética de São Paulo (Cesp) foi obrigada a cumprir por inundar milhares de hectares do lado de Mato Grosso do Sul com a instalação do lago artificial de Porto Primavera, a unidade de conservação Cisalpina, em Brasilândia, tem as características do Pantanal. Integra um complexo ambiente natural entre os dois estados banhados pelo Paranazão.
O ainda desconhecido Pantanal do Leste pelos turistas, como se diz na região, é formado por várzeas, alagados, vegetação, savanas e cerrados, um ambiente de solo, água, fauna e flora que se assemelha ao bioma pantaneiro. Uma foto aérea desse paraíso, banhado pelos rios da Bacia do Rio Paraná, confunde até mesmo os mais catedráticos estudiosos da maior área alagável do mundo.
Transformada oficialmente em Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) somente no ano passado, por resolução do Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul), Cisalpina é hoje uma das unidades mais conservadas do Estado. Além da gestão da Cesp, existe uma ação muito forte da Polícia Militar Ambiental (PMA) no combate à caça e pesca.
Último refúgio – O Pantanal Leste, na verdade, é um mosaico ecológico criado e mantido pela companhia paulista e ocupa uma porção dos territórios das cidades de, Naviraí, Taquarussu, Jateí e Brasilândia (MS), São João do Pau D´Álho, Dracena, Ouro Verde, Presidente Venceslau, Piquerobi, Guaracaí, Castilho, Paulicéia e outros municípios paulistas, totalizando 110 mil hectares.
Nasceu em razão do represamento do Rio Paraná e afluentes – medida polêmica na época, anos de 1980/90 – para construção de usinas hidrelétricas, quando foram expulsas centenas de famílias de pescadores, sitiantes e ceramistas, um impacto social sem precedentes.
Do lado de Mato Grosso do Sul, ainda foi criado, em 1998, o Parque Estadual do Ivinhema, o primeiro do Estado, com 73 mil hectares. Seus varjões compreendem o último trecho livre de represamento do Paraná e protege refúgios de espécies animais e vegetais do cerrado de floresta estacional.
“A Cisalpina é a reserva mais conservada que temos”, atesta Leonardo Tostes Palma, gerente de unidades de conservação do Imasul, explicando que sua regulamentação definitiva arrastou-se por mais de uma década por problema de documentação das posses, legislação conflitante e de grilagem.
A intocabilidade do local, no entanto, está sendo ameaçada pela estrada que cruza a área ligando Braslândia a Panorama (SP). Segundo Palma, apesar da boa sinalização, o intenso fluxo de veículos tem causado a morte de animais silvestres, como anta e cervo. A presença humana também é causadora de grandes incêndios, alguns espontâneos.
Ganho ambiental – Segundo estudos, Cisalpina, distante 14 km de Brasilândia, é um dos últimos redutos do cervo-do-pantanal fora do Pantanal. É um bioma que apresenta mosaico de floresta estacional decidual aluvial; savana arbórea (cerradão); savana (cerrado) e campos de várzea.
É uma extensa várzea inundada periodicamente na épocas das chuvas, com um complexo sistema de lagoas, córregos e canais interligados entre si e ao canal do Rio Paraná.
Seus 3.867 hectares formam um ambiente fluvial que, no passado, sofreu abandono gradativo e consequente ressecamento, motivados por processos climáticos e geológicos. Isso provocou um deslocamento da calha principal do Paraná para a margem esquerda. Devido a esse fato, é possível identificar na paisagem da reserva antigos canais utilizados pelo rio que remontam a um período de 10 mil a 40 mil anos,.
Levantamentos realizados por pesquisadores do campus da Universidade Federal de MS (UFMS) em 2011 apontaram que a proteção dessa área e o trabalho de recuperação e educação ambiental representam um ganho ambiental importante, sobretudo nesta região do Estado em que as áreas nativas têm perdido espaço rapidamente com o avanço do agronegócio.
Água e carbono – Nos últimos anos, ocorreu um significativo aumento no número de visualizações de pegadas de animais silvestres e até visualizações de animais adultos e de filhotes, mostrando que área está reunindo condições adequadas para a procriação de algumas espécies. Entre elas os estudos citam a anta, cervo-do-pantanal, onça parda, queixadas, capivaras, jacarés-de-papo-amarelo, tamanduás e também uma grande quantidade de aves, como tuiuiús, garças e biguás.
Cisalpina é um dos últimos remanescentes significativos das formações vegetais características da planície aluvionar do rio Paraná no trecho compreendido entre os municípios de Três Lagoas e Rosana (SP), com extensão de cerca de 300 quilômetros.
Como zona úmida, a reserva está entre os ambientes mais produtivos do mundo, que são considerados armazéns naturais da biodiversidade. Além disso, as zonas úmidas proporcionam sistemas de apoio à vida para grande parte da população ribeirinha, cumprindo funções ecológicas fundamentais como reguladora dos regimes hidrológicos e como formadora de um rico hábitat.
Contribui também para a estabilidade climática, por meio de seu papel nos ciclos globais de água e carbono, constituindo-se em um recurso de grande importância econômica, cultural, científica e recreativa.
Um fator de especial relevância é seu papel como abrigo de importantes parcelas das populações de espécies ameaçadas de extinção e impactadas pela formação do reservatório da Hidrelétrica Sérgio Motta.