Nhanderu Marangatu é epicentro de conflito fundiário prolongado e tensão devido a morte de um indígena
O território é o epicentro de um conflito fundiário prolongado, que ganhou ainda mais destaque na quarta-feira (18) , com a morte do jovem Neri da Silva Guarani Kaiowá, de 22 anos, assassinado com um tiro na cabeça, que teria sido disparado por um policial militar.
A cobrança por solução aos cercos sistemáticos contra indígenas no Mato Grosso do Sul tem vindo de diversos lados. A deputada Célia Xakriabá (PSOL-MG), que já havia protestado contra o que considera a omissão das autoridades competentes, também participou da reunião com o ministro.
“A violência só aumentou com a manutenção da Lei 14.701, a Lei do Genocídio! A demarcação de terras é urgente! Precisamos suspender as leis que perpetuam o genocídio dos nossos povos. Demarcação já!”, escreveu a deputada, em postagem nas redes sociais.
Em seu perfil no Instagram, Sonia Guajajara reforçou que o direito pleno à Terra Indígena já poderia ter sido assegurado aos guarani kaiowá, mas a tramitação foi interrompida e, depois, não houve finalização, mesmo em um cenário de acirramento das investidas.
Historicamente, há no estado um processo de retomada. Além do município de Antônio João, outros municípios são palco de disputa e os guarani kaiowá alvo de violência, como Caarapó, Dourados, Coronel Sapucaia e Ponta Porã.
Posse e usufruto
“A Terra Indígena Ñande Ru Marangatu foi declarada para posse e usufruto exclusivo e permanente do povo guarani kaiowá, em 2002. Em 2005, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva homologou a demarcação das terras Ñande Ru Marangatu, no sul do estado, mas o então ministro do Supremo Tribunal Federal Nelson Jobim suspendeu os efeitos do decreto presidencial”, afirmou a ministra.
Com a decisão liminar, ministro Nelson Jobim suspendeu os efeitos do decreto de homologação da Presidência da República até que a ação fosse julgada pelos ministros da Corte.
Como autores dos crimes e das ações de repressão praticados na região são apontadas pessoas ligadas ao agronegócio. A Comissão Guarani Yvyrupa (CGY) classifica a investida dos últimos dias de “ataque paramilitar coordenado”.
Em 2019, conforme o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) denunciou em seu relatório anual, houve casos de tortura contra crianças. Em 2022, Mato Grosso do Sul registrou 38 assassinatos de indígenas, ficando no topo da lista, junto com Roraima, que registrou 41. Segundo o Instituto Socioambiental (ISA), o indígena Neri da Silva Guarani Kaiowá foi “o quarto assassinado na busca por reconhecimento da Terra Indígena”.
Versão
Na versão mais recente do relatório, que compila dados do ano passado, o Cimi tenta expor a barbárie a que os indígenas do estado estão sujeitos para além da unidade federativa, nomeando quem a comete. A organização indigenista também havia declarado que as políticas públicas concebidas não foram eficazes o suficiente para pôr um fim nos casos de violência.
“Assim como nos anos anteriores, mantiveram-se com os maiores números de assassinatos de indígenas os estados de Roraima (47), Mato Grosso do Sul (43) e Amazonas (36). Os dados, que totalizaram 208 assassinatos, foram compilados a partir da base do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e de informações obtidas junto à Sesai via Lei de Acesso à Informação (LAI)”, documentou o Cimi no relatório divulgado este ano.
“O envolvimento de policiais militares em milícias privadas, investigadas pelas mortes dos indígenas, guarda semelhança com a violência registrada contra indígenas no Mato Grosso do Sul, onde forças policiais são acusadas de atuar como escoltas privadas de fazendeiros. informações foram processadas como suporte a ataques de seguranças privados contra comunidades Guarani e Kaiowá.
Além de despejos ilegais e ataques violentos contra acampamentos indígenas, também foram registradas prisões arbitrárias de indígenas na região”, diz o conselho, em outro trecho.
A cobrança por uma solução nos cercos sistemáticos contra indígenas do Mato Grosso do Sul tem vindo de diversos lados.
RELATÓRIO
O clima de tensão instalado na região sul-fronteira dominou os debates na Assembleia Legislativa. Os deputados questionam a ação da polícia. Para o secretário de Justiça e Segurança Pública, Antônio Carlos Videira, o serviço de inteligência da polícia teria identificado indícios de aliciamento de indígenas por traficantes que atuam no Paraguai. A área onde o indígena, foi morto é contígua a lavouras de maconha no Paraguai, separada apenas por um pequeno riacho.
“Estamos empenhados em que não haja mais conflitos”, frisou o governador Riedel ao presidente Lula, indicando também que já solicitou abertura de inquérito para apuração das circunstâncias que levaram ao assassinato.
Riedel e Lula também falaram sobre as suspeitas que envolvem o narcotráfico na região, com roças de maconha localizadas do outro lado da fronteira, próximas à propriedade ocupada no Brasil, e a presença de facções criminosas que estariam aliciando pessoas dentro das comunidades indígenas.
Segundo nota do governo, um relatório da inteligência será apresentado pelo governador a representantes do Governo O secretário de Justiça e Segurança Pública, Antônio Carlos Videira, culpou “índios paraguaios a serviço do tráfico de drogas” pelo acirramento dos confrontos no interior do Estado.
“Nós percebemos que nos últimos dias foi acirrando com a presença de ‘índios paraguaios’. Nós estamos ali numa região onde a fronteira é um rio pequeno, facilmente transponível; e do lado de lá nós temos diversas plantações de maconha… então há um interesse de facções criminosas que exploram o tráfico de drogas”, afirmou.
Sobre a morte do indígena, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a violência iniciada de madrugada se estendeu ainda durante o período da manhã, quando a Polícia Militar teria arrastado o corpo da vítima para um pedaço de mata, o que causou comoção e revolta dos demais indígenas.
Ação policial
O governador Eduardo Riedel disse que “lamenta profundamente” o episódio. Já Videira reforça que a ideia era tentar evitar confrontos, porém, que a situação fugiu ao controle. “Tudo o que a gente não queria era que isso acontecesse. Nós queremos de agora para frente é que se gerencie a crise para que nós não tenhamos mais nenhuma morte”, disse o secretário.
Videira disse que a presença ostensiva da polícia na região está apoiada em ordem judicial, para garantir o direito de ir e vir de trabalhadores e donos de fazendas na área.
“Temos aproximadamente 100 militares lá, de PMs; do Tático; batalhões da região; quatro equipes do Departamento de Operações de Fronteira (DOF) e batalhão de Choque também… vamos manter porque estamos cumprindo a ordem judicial”, disse Videira.
Em 2005 houve homologação da Terra Indígena em Antônio João como de ocupação tradicional dos indígenas de Nanderu Marangatu, onde está sobreposta à chamada Fazenda Barra.
(*) Com informações da Agência Brasil e Governo de MS
Imagem do destaque – Foto: Bruno Peres-ABr